50 anos de paixão pela ABTS
Por Ana Carolina Coutinho
“A ABTS corre no meu sangue, no meu sangue!”, foi com essa frase que Wady começou a entrevista para discorrer sobre os seus 50 anos de ABTS. Associou-se em 1972, quatro anos após a fundação da ABTG, ABTS, em 1968. “Eu queria ser conhecido e para ser conhecido eu tinha que fazer parte da associação que o Rubens Rodrigues dos Santos, meu chefe, já fazia parte, e que a Ruth Mueller, sócia fundadora, com quem eu também trabalhava e que igualmente fazia parte; ambos me motivaram. Assim, entrei em 1972”, conta.
De lá para 2024, foram 52 anos de participação ativa na ABTS. Inclusive, Wady, espirituosamente, sempre brincou que iria fazer uma matéria, chamada: ‘ABTS: Segredos Revelados’, e ele têm muitos, e, alguns, irá contar nessas linhas.
Testemunha ocular ativa de toda a história da ABTS, Wady Millen Junior entrou na associação depois de quatro anos de sua criação e nunca mais saiu, tendo, inclusive, participado de todas as suas diretorias dois anos após o seu ingresso. Acompanhe essa incrível trajetória que nos revela o amor de um profissional por sua atividade e pela ABTS, entidade que ajudou a desenvolver e fortalecer.
Surgimento da ABTG, posteriormente ABTS
Para começar, a história da fundação da ABTS. A ABTS foi fundada, em 1968, porque as empresas que existiam no Brasil, que faziam e forneciam produtos para galvanoplastia, não eram coligadas, era cada uma na sua. Na época, já existia a AES, American Eletroplating Society, que publicava uma revista nos Estados Unidos assinada por algumas pessoas do mercado brasileiro. Aí veio para o Brasil um Sr. chamado Gaston Zapata, de uma empresa que fornecia produtos químicos. Ele participava da AES, lá nos Estados Unidos, e ele precisava ter contato com as pessoas porque ele queria vender produtos químicos, e ele começou a fornecer para a Tergal e incentivou o doutor Ernani Andrade Fonseca e outras pessoas do setor a fundarem a ABTS.
Wady lembra dos fundadores, “Não posso esquecer de ninguém”; aqui estão eles, também responsáveis pelo primeiro corpo diretivo: Ernani Andrade Fonseca, Adolphe Braunstein, Gastón Zapata, Wolfgang E. Mueller, Ruth G. F. Mueller, Hong Wah Mo, Célio Hugenneyer, Cláudio Augusto Nara, Ludwig Rudolph Spier e Mozes Manfredo Kostmann.
Na época, a associação era chamada de ABTG (Associação Brasileira de Tecnologia Galvânica), Wady explica a mudança de nome ocorreu porque, ao tentar registrar ABTG, já existia uma outra entidade com a sigla, a Associação Brasileira de Tecnologia Gráfica. “Foi um desespero no Conselho. Conversa vai, conversa vem, e saiu Associação Brasileira de Tratamentos de Superfícies. Lindo, né?”.
Curso de Tratamentos de Superfície
Ao se associar à ABTS, Wady teve um colega que se tornou seu amigo por conta da mesma idade e também iniciaram na ABTS na mesma época, o Milton Miranda. Os dois foram responsáveis pelo primeiro curso para Encarregados de Galvanoplastia, conforme ele contou na Edição 239, pág. 20, da revista Tratamento de Superfícies. “Éramos dois moleques. Eu era vendedor técnico e eu tinha dificuldade de transmitir informações aos profissionais de base da área galvânica e comentava isso com o Milton Miranda. Foi no jantar da posse de ambos, em 1974, no Clube Pinheiros, que sugerimos a criação do curso para encarregados de galvanoplastia. Falamos direto com o Spier (Ludwig Rudolph), e ele deu todo o apoio”. Para se ter uma ideia, atualmente, a ABTS já realizou sua 159ª Edição do Curso Tratamentos de Superfícies, evolução daquele primeiro curso.
O Curso é, segundo Wady, sua maior realização dentro da ABTS, “Sempre gostei de dar aula”. Ele também lembra com carinho de Carlo Berti, que organizou e diagramou a primeira apostila do curso. “Ele era superorganizado, era uma apostila única; foi um trabalho maravilhoso”, lembra.
Funções na ABTS
O Curso de Tratamentos de Superfícies foi sua principal realização, mas não foi a única, afinal Wady participou, desde 1974, de todas as gestões da ABTS, passando por todas as funções do Conselho Diretor desde seu início, em 1974, como Conselheiro, tendo atuado como presidente em 1984 e 1985. Ao ser perguntado sobre qual foi a função mais desafiadora, ele é enfático: “Na verdade, todas elas foram desafiadoras para mim. Porque eu era muito jovem. Eu ainda nem era empresário”.
Entre algumas realizações que gosta de relatar, ele lembra de ter sido moderador quando o gênio da galvanoplastia, Professor Doutor Eugenio Bertorelle, autor do livro que é considerado a bíblia do setor, ‘Tratado de Galvanotecnica’, veio ao Brasil dar uma palestra. “Foi maravilhoso para mim porque eu usei muito esse livro, li muito, e achava difícil. Na primeira vez, até eu descobrir que cobre era rame em italiano...”, diverte-se.
Outra realização que destaca é a de ter sido diretor financeiro de Airi Zanini, quando atuou como Diretor Tesoureiro, de 1998 a 2000. “Sempre fui muito zeloso com dinheiro, para não dizer pão duro (risos), isso com o meu, agora, com o dos outros, muito mais”, diz. “A gestão teve resultados financeiros excelentes com EBRATS, cursos e palestras e workshops, e o Airi falou para mim que queria deixar alguma coisa para a ABTS, pedindo para eu ajudá-lo a pensar em algo. E eu sugeri: ‘Airi, por que a gente não bloqueia dinheiro para comprar uma sede?’. E assim foi, após uma negociação junto aos outros diretores, pois era necessário deixar um caixa para a próxima gestão.
Os refrescos
Wady sempre prezou pela integração dos associados. Seja em conversas informais como as reuniões do Conselho, “sou um dos mais presentes das reuniões; odeio faltar, odeio”, enfatiza. Para trazer leveza a essa integração, Wady foi responsável por implementar várias atividades em sua gestão como presidente. Na época, a ABTS usava uma sala do SINDISUPER na FIESP. “Em cima do prédio havia um restaurante, onde se faziam os coquetéis. No dia da reunião do Conselho, tínhamos primeiro uma reunião da diretoria e depois a do conselho, eram reuniões diferentes. Assim, instituí o almoço da diretoria porque os diretores iam, professores, diretores, e conversavam, trocavam ideias, e só depois fazíamos as reuniões, se formava uma pauta para as reuniões. Era muito interessante porque você jogava conversa fora e depois resolvia os problemas, isso aproximava”, conta.
Vale ainda trazer o show dos Demônios da Garoa que o Wady promoveu na “Época de Ouro” da ABTS, como ele mesmo diz. Foi em uma recepção especial, um jantar de encerramento do EBRATS, e ganhou um significado ainda maior porque ocorreu no dia 9 de maio, dia do aniversário do Wady. “Ganhei um presente da ABTS naquele dia, mas não posso mostrar porque fui assaltado e levaram, era um relógio”, diz.
Wady também instituiu o campeonato de futebol de salão, vencido pela COFAP. “Esses momentos eram importantes para fortalecer os laços dentro da ABTS. Apesar da competitividade do mercado, aqui dentro sempre existiu camaradagem. Esses encontros criavam uma conexão que ia além do profissional”, relembra.
Covid e a idade
Como ele mesmo contou, ele é presença garantida em todas as reuniões do Conselho, situação modificada pela pandemia de 2020, mas modificada apenas no modo de se realizá-la, porque ele também não faltou! “Tenho um grande amigo, o Rubens, que me chama de decano (risos), porque sou o mais velho aqui. Gosto muito de tecnologia, mas sou analfabeto nesse sentido. Quando começou a pandemia, sugeri a reunião virtual, e o Rubens falou assim: ‘O velho está dando uma sugestão’! (gargalhadas). E hoje se faz reunião da ABTS assim. Mas foi muito engraçado: ‘O velho tá dando, sugestão...’. O velho está sugerindo um negócio para gente nova”, rí, Wady.
Não foi a única modernização que Wady implantou. Ele também instituiu o pagamento virtual, gestão financeira que trouxe grande economia para a associação. “Antes da minha implantação o cheque precisava ter duas assinaturas, gastava-se motorista, motoqueiro, para ir na casa de um diretor assinar e depois na casa de outro; quando eu reassumi a tesouraria, implantei o pagamento virtual, eu e a Carolina. Eu vinha uma vez por semana, a Carolina dava a relação do que tinha que pagar, eu checava e fazia a autorização. A economia foi absurda! Também a primeira coisa que fiz quando compramos a sede velha, e voltei à tesouraria, foi o pagamento do IPTU no último dia do mês. Por quê? Porque eu recebo o dinheiro do mês todo e aí eu pago IPTU”, relata.
Dessa forma, Wady modernizou a gestão financeira, reduziu os custos operacionais e ainda mostrou que experiência e inovação podem caminhar juntas.
Principal desafio
Contudo, ele lembra algumas gestões mais difíceis, inclusive uma muito particular, na época do Governo de Fernando Collor, na gestão de Airi Zanini. “Foi um desafio muito grande. Estávamos sentados, eu, o Airi e o Carlo Berti, quando recebi uma ligação da minha secretária, dizendo que todo o dinheiro tinha sido bloqueado pelo Collor de Mello. Ou seja, sobraram 50 reais se fossemos comparar com hoje. Foi um horror! E eu não pude lidar mais diretamente – era conselheiro – porque minha tia estava no hospital e revezávamos para ficar com ela à noite. Ela ficou lá por seis meses. Eu fiquei ausente e o Airi ficou muito bravo comigo; mas hoje ele entende”, conta. Esse foi o momento mais difícil, mais emblemático”.
Legado
O legado de Wady Millen Junior é vasto e diversificado. Desde a criação do Curso de Tratamentos de Superfície, que ele considera a sua maior realização, até as transformações administrativas e financeiras, e o atual Estatuto, revisado em 2008, ele sempre teve como foco a evolução da ABTS e a capacitação de seus profissionais. “Se você deixar um legado educacional, algo que forme pessoas, esse é o maior presente que você pode dar a uma entidade. Meu sonho é ver a ABTS ainda mais forte, formando não apenas técnicos, mas profissionais apaixonados pelo que fazem, assim como eu fui por tantos anos”, finaliza.
Entrevista: Ping-Pong
Wady Millen Junior reflete sobre o futuro da ABTS e o papel da entidade no fortalecimento do setor de tratamentos de superfícies.
O que o senhor acredita que a ABTS poderia fazer para atrair novos profissionais ao setor de superfícies nos dias de hoje?
Eu vejo a ABTS como uma empresa, então, ela tem que estar em constante movimento; para isso, ela tem que olhar para o mercado. Algumas coisas que eu sempre falei e não sei por que não aconteceram: a gente precisa fazer pesquisa constante, para ver o que o mercado quer, e trazer novas ideias. É o que foi feito nesse último EBRATS. Veio uma personalidade, Maílson da Nóbrega, que falou de coisas que interessam às pessoas. Então, esse tipo de coisa que a ABTS precisa fazer. É abrir o laço.
Qual conselho o senhor deixa para os novos membros da ABTS?
Difícil, hein? Porque cada um tem uma cabeça. Mas eu gostaria que todos eles tivessem o mesmo amor, para não falar um palavrão, que é o meu jeito de falar, pela ABTS. A ABTS tem que estar acima de qualquer interesse individual. Se alguém tem que ganhar, é a ABTS, independentemente de quem seja, desde que seja alguma pessoa, ou pessoas que tenham a ABTS correndo no sangue, como eu tenho.
Como o senhor avalia a evolução tecnológica no setor de tratamentos de superfície e o impacto disso para a ABTS?
Vejo que cada vez mais a gente tem que preparar as pessoas de uma forma tecnológica. Eu sou do tempo de ser técnico, como a gente dizia, ‘com a barriga no tanque’, sabe? Então, tinha que ter conhecimento, prática, experiência, vivência. Hoje, com a tecnologia, você coloca as informações em um aparelho qualquer e ele te diz tudo o que tem em um determinado banho. Eu acho que a gente tem que preparar as pessoas para conseguirem ler esses resultados, mas, além de conseguir ler, humanizar os tratamentos. Eu vejo, por exemplo, no Brasil, muito médico que só pede exame e só sabe ler resultados dos exames, é a máquina que está fazendo. Eu acho que precisa deixar as máquinas, mas precisa humanizar.
Como o senhor enxerga o papel da ABTS na capacitação dos profissionais de tratamentos de superfície ao longo dos anos?
A ABTS foi fundamental! Vou jogar o confete para cima e enfiar a cabeça embaixo. O curso de galvanoplastia, que ainda existe e ainda está formando gente, foi fundamental e a ABTS tem que continuar trabalhando nessa formação. E cursos que não são comerciais, tem que ser respeitado isso que está acima do estatuto, divulgar e trazer gente para trazer experiência, para divulgar as experiências que não sejam só comerciais. É só assim. Formar gente. Se você pegar uma pessoa, professor, você forma um bom técnico. A ABTS tem condições de formar excelentes técnicos.