Nada é tão incerto quanto o futuro. Assim, é importante saber duelar contra um presente desafiador e enuviado. “O mentor que administra um empreendimento deve estar preparado não somente para administrar o caos, mas também para lidar com ele por muito tempo”
Na mitologia grega, Atlas foi merecidamente condenado por Zeus a escorar eternamente os céus, sendo responsável por sua conservação e total esteio. Como um imponente e valoroso titã: egocêntrico, portentoso e ávido por poder e glória, quis ousar com seus irmãos moldar um plano para tomarem o trono do monte Olimpo, lutando bravamente contra Zeus e suas estrelas, de sorte a serem eles os seres absolutos do Universo. Contudo, eles fracassaram na emblemática peleja, porquanto o poder do deus supremo era invencível e os destronou com força e cabal tenacidade. Atirados ao Tártaro após a esplendente fúria de Zeus, eles perderam-se para sempre na própria vaidade e insipiência, navegando pelo sombrio rio da ignorância que eles mesmos criaram para alimentar um dragão que, ao crescer, os devoraram malignamente até que não sobrasse nada além de desdouro, desalento, espavento e perpétua amargura.
Diferente dos seus irmãos de espada, Atlas, ao invés de frequentar as temíveis montanhas do Tártaro, foi castigado a sustentar o reino daquele que um dia tentou confrontar, sendo implacavelmente moldado para obedecer uma condenação do peso e do tamanho do pesadelo que pensara ser o seu airoso sonho dos sonhos, nas profundezas de seu aclamado, soberbo e angustiado coração. Após encontrar essa herança maldita, adornada de baluartes de horror, matriarcas do caos e patriarcas do pavor, Atlas nunca mais foi o mesmo e como um melancólico pássaro que, perdendo o dom e a vivacidade de voar, vive perpetuamente uma sofrível existência acinzentada, coberta de tristezas, pungimentos e infindáveis lamentações, pereceu, sem jamais poder voltar ao seu estado original.
Aristóteles costumava dizer que o nosso caráter é fruto da nossa conduta, isto é, nossas escolhas se desenham com aquilo que preservamos em nossa essência, em traços do nosso virtuoso núcleo interior. Atlas era dono de um coração perverso e contaminou sua vida com rixosos espinhos cuja toxina foi capaz de matá-lo e torná-lo um perdurável zumbi, sem rumo, virilidade e direção.
Representação de Atlas no Palácio Real, em Amsterdã, Holanda.
A lição de Atlas
Muitos gestores têm fracassado por não ostentarem o atributo mais importante do mundo dos negócios, o mesmo que faltou a Atlas, a saber: a humildade. O mentor que administra um empreendimento deve estar preparado não somente para administrar o caos, mas também para lidar com ele por muito tempo, sendo adaptável a todo momento, tendo sua organização como um meteoro de metamorfoses reluzentes capaz de enfrentar qualquer cenário, gerando ações inteligentes e inovadoras constantemente.
Jim Collins, com o brilhantismo que lhe é peculiar, sabiamente externou: “Se não está ruim agora, é questão de tempo.” Em poucas palavras o que ele quis dizer é que mesmo que o tabuleiro dos negócios pareça favorável e a empresa demonstre certa estabilidade e ascensão, o líder não deve esperar as coisas ruins acontecerem para desenvolver competências, ou seja, precisa otimizar sempre, buscando a excelência em todos os níveis independentemente da prosperidade alcançada e dos consequentes números positivos.
O real significado da Humildade
Humildade, nesse contexto, significa estar aberto para aprender sempre, como uma casa em longa e ininterrupta construção. A disciplina de demitir aqueles que estão entregando baixos resultados, de olhar a concorrência e procurar fazer algo criativo para surpreender os clientes, a sapiência de fortalecer as estratégias de marketing e as finanças, realizando investimentos assertivos e ideias mirabolantes, a habilidade de motivar os colaboradores a entregarem resultados invejáveis e surpreendentes regularmente, são alguns dos princípios cruciais para qualquer empresa se manter sólida e afortunada. Os japoneses têm isso impregnado na alma: a busca por melhorar sempre, por contemplar sempre o topo, seja por resultados, por melhores práticas ou pela nobre eficácia de suas insignes ações.
Foco no que importa
Administrar uma organização nunca será como viver no fantástico mundo da Disney, é um ato que deve ser tratado como ciência, como algo empírico, de modo a criar produtos e serviços baseados em decisões embasadas em fatos concretos, moldados por testes profissionais e eficientes, com alicerces conceituais e claros, com provas e ensaios côncavos próximos da perfeição.
Muitas empresas perderam seu foco diante dessa lendária crise, perante essa inacreditável e histórica pandemia causada pela Covid-19. Diversas organizações perderam suas identidades, sua aura organizacional, porquanto foram colocadas em redemoinhos que destruíram suas confortáveis e pujantes posições no mapa.
Épocas turbulentas exigem intrepidez nas tomadas de decisão. Há riscos necessários para implementação de mudanças assertivas que são capitais para a execução e continuidade de processos de excelência. A criatividade deve ser o ingrediente principal, gerada por equipes de alto desempenho, com autonomia e valor para que as estratégias sejam alcançadas e mantidas mesmo com o globo sendo estimulado por terremotos e assombrosos vendavais sem fim.
Embora todos esses ensinamentos sejam riquíssimos e poderosamente necessários para o êxito das empresas no ambiente incerto e estranho em que vivemos, a maior lição ensinada pela crise mundial e seu nefasto vírus é, sem dúvida alguma, o otimismo. Chaplin me educou que a vida será sempre perfeita, desde que jamais voltemos os nossos olhos para o medo. Desta forma, o segredo é sorrir, enfrentar os problemas de cabeça erguida e agir para que sempre seja feito o melhor que puder ser feito, em todas as direções e escolhas dos nossos brilhantes e formosos cosmos.
Essa venturosa questão também se aplica à vida pessoal de qualquer indivíduo: não é necessário uma morte, a explosão de um vírus mundial, a descoberta de uma doença grave, um trágico acidente, uma crise financeira ou qualquer outra gama de problemas corriqueiros da humanidade para reservar um tempo para passar uma tarde com os familiares, para tomar um café com um amigo, para presentear quem se ama, para visitar uma avó que há tempos sente saudades, para comer o prato predileto, para dançar sozinho na chuva, para ajudar um desconhecido a comprar comida e a se levantar de uma caverna fria e umbrosa, para valorizar a vida e suas belezas mais sublimes, em síntese, para qualquer coisa que seja capaz de elevar a existência e suas esferas mais enobrecidas e felizes.
*Este texto foi originalmente publicado no site administradores.com.br, do qual Pablo Bravin é colunista.