Não adianta levantar da mesa com papel e caneta na mão para parecer ocupado porque ninguém vai ver
Sócio-diretor da FSB Comunicação*
Estamos todos trabalhando mais na pandemia. O trabalho remoto aumentou a produtividade de quem tem feito home office e, de forma geral, a velocidade com que as coisas acontecem. A tolerância com o trabalho medíocre diminuiu muito, senão acabou. É um tanto desconfortável admitir isso, mas ao que tudo indica a pandemia fez os brasileiros trabalharem melhor e de maneira mais eficiente.
Isso vai contra o que nove entre dez gestores pensavam sobre o home office: dizia-se, muitas vezes, que as pessoas não renderiam tanto à distância. O rendimento e a qualidade geral do trabalho coletivo, ao contrário, nunca foram tão altos.
Tudo ficou exposto, a tela virou uma vitrine. Se você não tiver o que mostrar, é melhor nem falar. Porém, se você não falar, vão pensar que você não está fazendo nada. Estar ciente disso talvez seja a principal causa do aumento do estresse e fadiga mental que estamos sentindo. E assim vamos pulando de reunião em reunião, fazendo entregas complexas e respeitando horários sem parar para beber água ou ir ao banheiro. A próxima pandemia provavelmente será de pedra no rim.
Se toda crise é oportunidade disfarçada, e se vale a regra de fazer uma limonada com os limões que a vida nos relega (eu sei, dois clichês na mesma sentença, peço perdão aos escassos leitores), devemos encontrar um equilíbrio e incorporar aspectos desta nova realidade à nossa rotina pós-pandêmica. Uma pesquisa da Escola de Economia da FGV-SP, feita antes da pandemia, mostrou que o trabalhador brasileiro levava uma hora para fazer o mesmo produto ou serviço que um norte-americano consegue realizar em 15 minutos, e que um alemão ou coreano em 20 minutos. Espaço para melhorar, portanto, havia – e muito.
Um compromisso qualquer normalmente começava 15 minutos depois do horário. Os dez minutos seguintes (pelo menos) serviam para jogar conversa fora. Hoje, se você atrasa um minuto para entrar na reunião pelo ‘Teams’ (coloque aqui o nome do seu app de videoconferência preferido) já há alguém ligando ou mandando mensagem perguntando por você. Se você atrasou dez minutos, já perdeu o fio da meada da reunião porque a conversa já está lá na frente.
É o fim do working simulation, um conceito genial definido por um colega anos atrás. Você já ouviu aquela regra segundo a qual nunca se deve levantar da sua mesa sem um papel e uma caneta na mão, para parecer ocupado? Isso perde o sentido quando não tem ninguém olhando para você, depois que você sai da tela. É também uma mudança cultural repentina e gigantesca principalmente para nós, latinos, acostumados a fazer hora no café e jogar conversa fora enquanto fuma um cigarro no térreo – ou acompanhando alguém que fuma.
Talvez sintamos saudades de como a vida no trabalho era antes da pandemia. A realidade, porém, se impõe como sempre, e cabe a cada um de nós encontrar harmonia neste caos.
*A FSB Comunicação, da qual Rodrigo Pinotti, é sócio-diretor produz conteúdo estratégico divulgado pela plataforma Bússola em parceria com a Exame, onde este artigo foi inicialmente publicado; acesse aqui: https://exame.com/bussola/o-fim-do-working-simulation-estamos-trabalhando-mais-e-ponto/
(Foto: Arquivo pessoal/Divulgação)