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As histórias, e estórias, de Raul Arcon Grobel em seus mais de 40 anos de setor


Grandes ProfissionaisTS 242 27 de agosto de 2024 | Por: Portal TS
As histórias, e estórias, de Raul Arcon Grobel em seus mais de 40 anos de setor

As histórias, e "estórias", de Raul Arcon Grobel em seus mais de 40 anos de setor

por Ana Carolina Coutinho
Entrevista: Danilo Cardoso

“Meu primeiro contato com a área galvânica foi ainda criança, pelos idos de 1966, quando estava prestando exame de admissão para ingressar no ginásio do Colégio Campos Salles, na Lapa (bairro paulistano), quando conheci os irmãos Begliominis, Bruno e Carlos, filhos do Sr. Ido Begliomini, dono da extinta Niquelação e Cromação Universo”, inicia seu relato, o Sr. Raul Arcon Grobel. Esse encontro de amigos é importante porque Bruno era “o craque do time da rua e era, também, o dono da bola (rs)”, bola que foram buscar na empresa do pai dele; acrescenta o Sr. Raul: “Lá, me deparei com tanques de várias cores: azul, verde, amarelo acastanhado... aquilo me chamou a atenção, além de ter tido meu primeiro contato com aquele cheiro. Foi quando me disseram que o cheiro era proveniente de gases exalados pelos banhos galvânicos”, recorda.

Outro sinal indicando o futuro do Sr. Raul também se apresentou naquela época e era envolto a um mistério. Na mesma rua em que ele jogava bola, tinha um senhor que saia pontualmente todo o sábado à tarde, fazendo com que os meninos parassem o jogo para ele passar de carro. “Perguntei ao meu amiguinho, vizinho dele: ‘Aonde esse cara vai todo sábado à tarde?’. A resposta foi de que ele tinha uma empresa na Av. Moffarej, na Vila Leopoldina, em que precisava averiguar umas peças. Fui saber depois que era o Sr. Volkmar Ett, dono da Cascadura Industrial e futuro presidente da ABTS!”, conta.

O interessante é que apesar de o pai dele ser químico responsável e diretor da Quartzolit, e o irmão, 12 anos mais velho também ser da área, Raul ainda não sabia se gostaria de seguir no mesmo caminho. “Eu ainda não tinha um objetivo claro de fazer Química, pois gostava também da área elétrica e, principalmente, de oficina mecânica – desmontava e remontava peças do fusqueta de minha mãe, para desespero do meu pai”, diverte-se; mas o destino tem os seus próprios meios.

Ainda indeciso sobre seu caminho profissional, Raul decide fazer o Científico, colegial da época destinado àqueles que desejavam se graduar nos curso de exatas; paralelamente, fez um curso de Controlador e Inspetor de Qualidade, era 1975. “Foi assim que comecei a trabalhar na SOFUNGE, uma empresa de fundição, do grupo Mercedes, que fornecia blocos de motores, entre outras peças. Trabalhei na área de fundição e macharia, controlando o processamento de areia para fundição (quartzo, sílica, shell...), seus meshes, perdas de peças, controle de parâmetros das máquinas de injeção, etc.”, relata.

Na época, Raul conseguiu entrar em duas faculdades: na Faesp, em Engenharia Elétrica, e na Oswaldo Cruz, em Química Industrial. Seu trabalho, na SOFUNGE, deu-lhe uma ‘forcinha’, digamos assim. Lá havia um laboratório químico e “durante os dois anos que fiquei lá não apareceu nenhuma vaga, pois eu tinha um ‘porém’: não havia feito curso técnico de Química, mas tinha entrado na Oswaldo Cruz”, e foi assim que ele optou por seguir com a Química lndustrial.

A oportunidade no laboratório não surgiu e ele pediu demissão, logo se recolocando em uma pequena empresa, “chamada Cidefer”. Atuou como auxiliar de laboratório, onde aprendeu a fazer análises químicas de componentes de ferro fundido, bem como análises de areia. “Pouco fiquei naquela empresa, pois recebi, em 1977, um chamado do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) para o cargo de Técnico Químico.

Lá, fui trabalhar com o renomado professor Dr. Adalberto Bierrenbach; foram três anos de aprendizado na área metalográfica, e muito aprendi também na área de ferro fundido e ferro nodular”, diz, e destaca: “O ponto alto foi levar uma peça com esse material para testes na Mercedes-Benz e saber depois que todo aquele trabalho, feito com a equipe do Dr. Adalberto, havia dado ótimos resultados!”.

Quando o Dr. Adalberto foi para outra empresa, o departamento em que atuava começou a carecer de inovação; diz o Sr. Raul: “Assim, resolvi tentar alguma vaga na área química em outros departamentos do IPT, principalmente no setor da área de tintas e vernizes, à época, responsabilidade gerencial do Sr. Celso Gnecco, hoje instrutor da Abrafati (Associação Brasileira dos Fabricantes de Tintas)”.

Ocorre que houve um repeteco de uma mesma situação, não havia vagas! “O jeito foi enviar currículo para todo o Brasil!”, conta rindo. E, com o destino no comando, o Sr. Raul recebeu, em 1980, um contato da Orwec Química. Na época, a empresa era uma das maiores do país, representando, no Brasil, a Enthone, DWK e Kenvert. Ele foi entrevistado por uma das maiores lendas do setor: o Sr. Mozes Manfredo Kostman. “Foi muito interessante; cheguei lá, me apresentei e ele perguntou se eu estava de carro, eu disse que sim. Ele dispensou o seu motorista particular e me fez levá-lo do bairro do Brás (região Centro-Leste) até Santo Amaro (Zona Sul), na Wallita. E, assim, fui entrevistado nesse trajeto. Quando cheguei lá, por obra do acaso, fui apresentado, logo na portaria, ao falecido Sr. Milton Miranda, responsável pela área galvânica da empresa, e que se tornou, depois, sócio dos Sergios (Pereira e Camargo), na Tecnorevest”.

Depois, a saga

Após a entrevista, o Sr. Manfredo disse-lhe para aguardar notícias. Após duas semanas, uma nova com outro gestor da empresa; Raul o considera seu mestre e professor, era o Dr. Malvino Bassoto. “Incrível como ele tinha conhecimento da área galvânica, pena não ter podido aprender muito mais com ele, o mercado perdeu muito com sua partida”, conta. Novamente, disseram-lhe para “aguardar notícias” (rs). Após um mês, foi chamado para conversar com mais um executivo, “agora com o Gerente de Vendas, Sr. Pedro Penteado, o qual devo muito daquilo que posteriormente aprendi, na área de vendas”. Finalmente, “o Sr. Pedro Penteado disse: ‘Começa na próxima semana’. Ufa!”, brinca.

Posteriormente, o Sr. Raul acabou descobrindo o porquê de tantas entrevistas: “Quem trabalhava na área de vendas estava para sair da Orwec, era o Arnaldo Pereira (Arnaldinho), que estava indo para a Arteb e que, posteriormente, virou nosso concorrente na Berlimed, hoje Atotech”.

Para ser um bom vendedor, Raul precisou colocar a barriga no tanque e aprender sobre os mais de 200 produtos da empresa, que estavam explicados em uma pasta que ele lia “dia e noite”. No laboratório piloto, conheceu Dona Yoko Sato. “Ela também se tornaria minha mestre e professora, incrível a sua capacidade técnica! Foram inúmeros casos que ela me orientou por telefone, para que os clientes obtivessem êxito na utilização dos processos. Sou muito grato a ela, assim como a seu esposo, Odier, que, embora não trabalhasse mais na Orwec (estava na época na Fama Ferragens), me esclareceu tecnicamente muitos processos”.

Profissionais de excelência

É muito interessante como, ao longo da vida, encontramos pessoas com a mesma intenção e afinidades. O Sr. Raul teve o privilégio de conhecer e trabalhar com grandes nomes do setor, como o Casiano (Risadinha), “‘o cara’ em verniz cataforético”; o Amadeu Cordeiro, “que encontraria em outras oportunidades, tanto na Chemetall quanto na Coventya”; José Carlos D’Amaro, “meu maior incentivador”; e também Riad Sabag, Carlos Mummi, Rocco d’Ascanio, Eduardo Torri e Amadeu.

Nessa época, uma transformação na vida pessoal de Raul: “Resolvi casar; o que me ajudou muito, fiquei mais centrado. Devo muito à minha querida esposa, Cecília, pelo enorme incentivo que continua até hoje”, enaltece. Com o conhecimento adquirido, o Sr. Raul passa a atuar na Zona Sul de São Paulo, região que concentrava muitas empresas do setor; seu objetivo era realizar de 110 a 115 visitas por mês. “Inimaginável, e triste, saber que existem, hoje, poucas empresas do ramo na região, assim como em outras”.

Em uma das visitas, Raul recorda-se de um fato “que poderia ter mudado meu destino”. A empresa, toda reformada, com “funcionários uniformizados, faixas brancas pintadas nos corredores, recuo para extintores de incêndio, área de fumantes, área de café, ou seja, uma revolução para a época! Enquanto o responsável me mostrava tudo isso, fiquei imaginando a hora de ver a nova galvânica. Abriram uma porta de aço blindada, que dava para um estacionamento e, no fundo, tinha uma grande casinha parecendo um paiol. Quando abriram a porta, uma fumaça branca enorme saiu com cheiro terrível de ácido, e lá estavam 10 seres esfarrapados (rs) junto dos tanques velhos. Isso me impactou no sentido de que se eu realmente iria seguir no ramo...”, recorda. E ele seguiu.

“Ainda bem que as leis ambientais e trabalhistas vieram a melhorar, e muito, as mudanças no setor; logicamente, aquela empresa automatizou a linha (rs)”. Foi nessa época que ele começou a frequentar a ABTS, antiga ABTG, “onde aprendia muito com todos”, e também começou a participar do EBRATS, sendo assíduo, da segunda edição até 2018.

Além de sua formação como Químico Industrial, Raul também se tornou Engenheiro Químico. “Nesse momento, me apaixonei por uma matéria chamada Máquinas Térmicas, os projetos de máquinas, os cálculos de entalpia, entropia, me entusiasmavam e me faziam pensar em procurar outros rumos, mas os cheiros dos vapores ácidos e alcalinos não me deixaram sair do ramo e, assim, continuei”.

Raul ficou na Orwec por 14 anos, até o fim de 1993, “como Supervisor de Vendas das áreas Sul, Oeste e Norte. Fiquei muito triste quando sai, mas precisava respirar novos ares”, diz.

Ele conta que o Sr. Roberto Motta de Sillos, Diretor Comercial da Inbra, o convidou para se juntar à equipe, foi um novo desafio, pois pediu que o enviassem para uma outra região a fim de conhecer novas empresas. “Deram-me a região do ABCD, um novo desafio, e, assim, em 1994, voltei a ser Representante Técnico”.

Na Inbra, Raul permaneceu por mais de dez anos, quando houve nova reviravolta do destino. “Com o apoio de Douglas Bandeira, Supervisor de Vendas, e outro excepcional profissional, fizemos um trabalho conjunto de abertura de clientes e conquistas de linhas galvânicas que perdurou por 12 anos. Foram desafios promissores, conheci novas pessoas, novas empresas... Um dia, voltando de férias, em 1995, me perguntaram: ‘Você ficou sabendo da novidade? A Chemetall (à época representada pela Inbra) chegou no Brasil em definitivo; a Inbra continuará seu caminho, mas todos, da divisão Plating, fomos transferidos para Chemetall”, relembra. E continua: “Com ela, em 1995, chegou o Sr. Antoine Lopes, novas ideias, propostas, conceitos, auditorias. Foram tempos difíceis, inesquecíveis, tensos, mas desafiadores com a introdução de novas tecnologias para zinco e ligas de zinco; fomos os campeões nisso, uma gama de novos processos chegavam a todo momento, seja na área protetiva ou na decorativa. Foram momentos maravilhosos!”.

Inovações

Raul conta que fez um treinamento “meio a contragosto”, era de algo inusitado para época porque era zinco isento de cianeto, “tecnologia que não funcionava muito bem no Brasil, havia problemas de queima na alta densidade e uma falta de penetração, resultando numa distribuição irregular da camada eletrodepositada”, explica. Ao visitar um cliente, propôs a tecnologia, que foi aceita; ele detalha: “Uma das características do processo, e que se diferenciava dos demais, era a introdução de um tanque-mãe para dissolver o zinco e repor no sistema, o processo utilizava anodos de ferro como ânodo, tudo muito estranho para a época, inclusive, lembro que o encarregado dessa empresa virou para mim e perguntou: ‘Os anodos são de ferro?’; sim, eu disse. Ele riu e me disse de alto e bom som: ‘Isso não vai funcionar’ (rs)”.

O processo surpreendeu e foi um “sucesso total; e depois vieram os processos de ZnFe e ZnNi, igualmente incomparáveis. Como tudo neste mundo, após alguns anos, os concorrentes também chegaram com tecnologias similares”, conta.

Foi na Chemetall que Raul começou a realizar pequenas apresentações e palestras, “justo o que eu detestava fazer, foi mais um aprendizado! Também fui apresentado ao complexo mundo dos parafusos, uma ciência à qual, do pouco que aprendi, devo ao Sr. Roberto Garcia”. O ciclo na Chemetall se encerrou em 2003, “quando ela vendeu a divisão de eletrodeposição para a Coventya”, relata. Seguindo os rumos de seu destino, sua atuação na Coventya era direcionada ao setor automotivo. “Foram épocas desafiadoras às quais outras diretrizes e também o gerenciamento de vendas, me foram dadas pelo Sr. Bruno Mattana, como a responsabilidade de dar apoio aos nossos clientes parceiros junto à indústria automotiva, apresentando montadoras, novas tecnologias, além de tentar fazê-las indicar nossos produtos e processos, uma vez que a maioria das homologações vinham das matrizes automotivas”, relata. Foi uma de suas experiências mais marcantes.

“A Coventya tinha um grupo de 8-9 pessoas responsáveis, no mundo todo, para essa finalidade, chamava-se KIM (Key Industry Manager). Foi uma das minhas melhores e sensacionais experiências. Consegui, por meio de um trabalho árduo e contínuo, os melhores resultados, alguns até mesmo não conquistados internacionalmente pelo grupo KIM. Orgulho-me muito desse trabalho! Logicamente, tive apoio, não só do Mattana e da Coventya, mas também do Sr. Rainer Venz, nosso chefe maior no KIM, com quem realizei alguns workshops de sucesso, juntamente com as montadoras”, destaca.

O acaso mais uma vez se apresentou, porém, no mundo todo: foi a pandemia da Covid-19, em 2020, um período obscuro. “Parti para apresentações on-line, mas me senti incomodado. Tudo era frio, não enxergava as pessoas, não sentia seus sentimentos e reações, não tinha percepção do que estava ocorrendo do outro lado das apresentações. Tudo ficou difícil. Quem trabalha na área comercial sabe que o tino da sensibilidade in loco é muito importante para qualquer situação. On-line, a interação é totalmente diferente e isso me abalou de alguma forma, não via mais luz no fim do túnel, e já havia firmado, em comum acordo com o Mattana, de encerrar minhas atividades, o que ocorreu em Julho de 2021”. Pouco tempo depois, a Coventya viria a se tornar uma empresa do Grupo Macdermid.

O mercado hoje

Apesar de não estar mais atuando no setor, o Sr. Raul vem trocando ideias sobre o mercado com alguns colegas. “Sinto que continuamos a ter sérios problemas de custos; a cada dia, galvânicas são exprimidas e suas lucratividades diminuídas. Observei muitas empresas prestadoras de serviços encerrando suas atividades, tornando o grau de competitividade entre os grandes formuladores ainda maiores e desafiadores, com muitas dificuldades com preços, a maioria dolarizada. O pós-venda continua, e continuará, a ser uma diferença, dependemos também de que a economia funcione a contento; somos muito dependentes da indústria automotiva e não creio que a tecnologia automotiva elétrica vá abalar o mercado, aposto que ela será híbrida!”, assevera.

O executivo deixa um recado: “Aprendi muito e agradeço a toda essa turma de profissionais, e a muitos outros não mencionados aqui. Posso dizer que sempre, em diversas situações em minha vida pessoal cotidiana, aplico minhas tarefas com dedicação, determinação, garra, persistência, disciplina, paciência, e com objetivos claros! Hoje, aposentado, tenho como hobbie fazer minhas longas caminhadas, trotar, nadar, além de amar fazer trilhas e expedições com meu outro amor: o Troller. Assim vou curtindo minha esposa, meus filhos e netos, entre idas e vindas, de São Paulo a Caraguatatuba, onde além de apreciar o mar e as montanhas, faço uma análise particular minha dos meshes da areia da praia e quando entro no mar me sinto como uma peça ionizável em uma solução, que pode se tornar eletrolítica se houver um raio (rs). Ah! A Galvânica”, finaliza.

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